Meu lugar no mundo

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Desde pequena, eu sempre vivi uma espécie de desassossego, de não pertença, de inadequação, seguidos da sensação de que havia um lugar e que um dia eu encontraria esse lugar, o meu lugar. Aos onze anos fui a São Paulo pela primeira vez para o casamento de uma prima. Viajamos de Empresa Cruz. Algo totalmente inusitado para uma criança acostumada a percorrer apenas pequenas distâncias entre as cidades circunvizinhas. A excitação era tanta que, embora tenhamos viajado à noite, permaneci acordada o tempo todo, dividindo a atenção entre as luzes dos faróis dos veículos que vinham na direção contrária e o ronco de alguns passageiros. Quando o ônibus entrou em São Paulo, mesmo não tendo passado pela Ipiranga com a Avenida São João, alguma coisa muito forte aconteceu no meu coração. Aquela imensidão de prédios enormes, muitas luzes, muitos carros, tudo aquilo foi me fascinando. Acordei a minha mãe, que ressonava tranquilamente ao meu lado, e disse para ela: “Mãe, eu quero me mudar pra cá!”. O que para mim foi fascínio, para ela foi pânico, e ela me disse: “Você tá louca, minha filha! Isso aqui não é lugar de gente!”.
Ficamos três dias na capital, saímos da casa da minha tia apenas para ir à igreja onde foi celebrado o casamento, a poucas quadras de distância, e de lá, novamente para a rodoviária, na época, ainda a rodoviária velha, localizada onde hoje fica a cracolândia. Mas, para mim, aquele era o meu lugar no mundo! Isso se deu há mais de quarenta anos e, embora eu nunca mais tenha voltado à casa daquela tia, ainda hoje lembro os detalhes do lugar e o endereço: Rua das Laranjas, nº 210, Freguesia do Ó. Até o nome do bairro me soou poético e agradável. Voltei para Monte Alto apenas para esperar o dia de me mudar para São Paulo e esperei pacientemente até que, aos 25 anos, comprei minha passagem e parti sem olhar pra trás.
Nem tudo foram flores. Algumas condições a gente só percebe quando está fora de nosso habitat. Por exemplo, precisei mudar para São Paulo para me dar conta de que era uma caipira, o que ficava claro principalmente no meu sotaque. As pessoas da capital são diferentes, têm outros hábitos, outro modus vivendi, outro ritmo. Na maioria das vezes impera a lei do cada um por si e Deus por todos. O começo foi sofrido. Lembro que uma vez que fiquei perdida no centro da cidade, com problemas de dinheiro, saudades de casa, falta de amigos, então olhei para as palmeiras imperiais da Praça da Sé e disse: “Esta cidade, ou a gente a vence ou ela nos vence.” Internalizei isso e parti pra batalha e venci, cheguei até a me tornar amiga dela, conhecer seus principais lugares, suas nuances, os macetes básicos de sobrevivência na selva – de pedra. Foram duas décadas de affair, até que a poluição, o barulho, os ônibus e metrô lotados, o trânsito cada vez mais carregado foram me cansando e eu voltei a sentir aquela inquietação da infância, aquela sensação de que deveria haver um lugar, o meu lugar…
De São Paulo, mudei para Atibaia, a apenas 70 km de distância, mas com um tipo de vida totalmente diferente. E radicalizei: mudei para uma chácara no meio do mato, longe da civilização, cercada de natureza e ar puro por todos os lados. Continuei trabalhando em São Paulo, indo e vindo diariamente, parando o carro para a passagem de vacas e lebres do mato pela manhã e sendo fechada e pegando engarrafamentos infernais no fim da tarde. Mesclando a modernidade caótica e o ar bucólico todos os dias. Ferindo os olhos com a poluição e perdendo-os na imensidão das estrelas do céu mais limpo e lindo que já vi na vida, todas as noites.
Mas, apesar da paz e do aconchego proporcionados pela minha romântica casa das montanhas, era açoitada continuamente pela solidão e, conquanto fosse aquele o lugar que eu escolhi e a casa que construí, me esmerando em cada detalhe, para nela passar o resto da minha vida, vez em quando revivia a velha sensação de que devia haver um lugar… Então, encontrei um grande amor e, muito rapidamente, sem ter tempo para pensar, me vi deixando a minha casa encantada, mudando o local de trabalho e me transferindo de mala, cuia, cachorros e sonhos para Mogi Guaçu, uma cidade da qual eu nunca tinha ouvido falar. Para mim, Mogi Guaçu era um rio, e na verdade, é, “um rio que passou em minha vida e meu coração se deixou levar”. Um lugar que eu não escolhi, que me escolheu, que me acolheu e para onde me transportou a correnteza do amor. Estou morando em Mogi Guaçu, ou “no Guaçu” como se diz por aqui, há quase dois anos, mas tudo ainda me parece novo. Embora não seja uma cidade grande, tudo sempre me parece novo, é um lugar que redescubro a cada vez que saio de casa, a cada rua que percorro, a cada árvore que conheço, a cada pessoa com quem converso.
Bem, finalmente, encontrei o meu lugar e tenho certeza de que nunca mais voltarei a sentir aquela sensação de desconforto e não pertença. Num pedacinho deste lugar banhado por um caudaloso rio um dia meu corpo repousará e voltará para o pó da terra. “Nossa! poderão pensar meu leitores, andou tanto para acabar em Mogi Guaçu, para encontrar seu lugar em uma cidade de tão pouca expressão e que nem sabia que existia?”. É aí que está o grande segredo, a suprema magia: Mogi Guaçu também não é o lugar que eu procurava, que sabia que existia e que um dia iria encontrar. “Não??? Como assim?”. Bem, é simples, o lugar que eu procurava e que muitos também procuram não é um lugar geográfico. A minha “terra do nunca”, a minha Califórnia, a minha Canaã, não é um espaço físico. É um estado sem tempo e lugar. Aquela terra que eu tanto procurei, que tanto ansiei encontrar, sempre, por todos os caminhos por onde andei, esteve dentro de mim, se chama paz de espírito, se chama amor e, quem não a encontra, pode ir a qualquer parte do mundo, que nunca se sentirá pertencendo, nunca se sentirá feliz. Eu poderia ter encontrado a minha Xangrilá aí mesmo, em Monte Alto, mas, quis a vida que eu fosse meio nômade, que viajasse um bocado para, finalmente, poder repousar em mim.

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