No livro “A sociedade paliativa” do autor sul-coreano Byung Chul Han, há uma reflexão profunda de como a sociedade hodierna lida com a dor. Uma das várias frases impactantes citadas no livro, diz o seguinte: “A nossa relação com a dor mostra em que sociedade vivemos”. Tratando-se de sociedade, percebe-se a fuga pelo sentimento, pelo compromisso e pela busca da verdade num mundo disfarçado por filtros, falsos sorrisos e por alimentar as utopias que se disseminam pelas redes sociais. O Homem teme pela dor e isso faz com que ele se alimente das inverdades, da inexistência dos fatos e inclusive do seu próprio eu. O homem teme pelo compromisso e pela responsabilidade. À medida que as tecnologias evoluem, o homem se torna escravo da ignorância, do fútil, do nada. É por isso que as inteligências artificiais dominarão o mundo, porque não teremos mais o homem letrado, intelectual e sábio. Atualmente, tenho presenciado uma nova forma de comportamento que confirma todos os outros citados, e que é um exemplo desta sociedade paliativa citada pelo Byung Chul Han: famílias, indivíduos e pais de bebês reborn.
Vivemos numa época em que a algobofia – medo de sentir dores físicas ou morais – tem dominado os espaços do comportamento do homem. Há uma sociedade que teme pela dor e que evita qualquer sentimento que a faça sofrer. Como pais, sabemos das dificuldades de colocar um filho no mundo. Quando nasce uma criança, nasce o homem e a mulher. Um filho nos torna um ser evolutivo. Nós evoluímos como pessoa e como cidadão. Não há nenhuma possibilidade de evolução espiritual quando se ama uma boneca inexpressiva que não dorme, não chora e não se amamenta. Não há amor, apenas uma utopia de felicidade para evitar as dificuldades que mães – principalmente as mães – e pais passam para criar e educar um filho.
Ao redor do mundo, há crianças órfãs procurando por novos lares, por amor, esperança e felicidade. Crianças que viram seus verdadeiros pais morrerem pelo ódio das guerras, por doenças ou pelo mundo do crime. Elas esperam ser amadas, educadas e anseiam por um futuro digno. O ser humano tem invertido tantos os valores que a verdade já não lhe parece mais a verdade. Estamos nos alimentando da mentira. Esta nos destruirá como cidadão e como família. A ignorância tem tomado tanto espaço que daqui a pouco essas bonecas – se já não acontece – começarão a passar por consultas médicas, psiquiátricas e odontológicas. Tenho certeza de que elas tomarão o lugar das verdadeiras crianças que adoecem por falta de amor e morrem por falta de perspectiva. Toda vez que vejo uma família assim – reborn – morre comigo a esperança de uma criança necessitada de colo e carinho. Cada dia que passa, o futuro da sociedade é mais incerto do que os próprios comportamentos de famílias com boneca na mão.