Fazendo a colheita do plantio

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Estou viajando a trabalho, hospedada numa cidade onde tenho parentes. Ontem, aproveitei para jantar com os primos que não via há longa data e me surpreendi muito com comentários muito doloridos que meu primo fez.

Ele é um profissional bem sucedido, creio que seja a pessoa da família que deu mais certo na vida, lutou contra todas as adversidades, estudou, batalhou, arriscou, empreendeu e venceu. Mas, não demorei a perceber que ali, sentado à mesa da copa da casa de sua irmã, não era o empresário bem sucedido com um carrão parado na porta, mas, sim o mesmo adolescente frágil dos tempos idos. Talvez mais frágil do que jamais eu o tenha visto.

Na mocidade, a fragilidade de cada um de nós era alimentada pela esperança, pela coragem de lutar, pela vontade de vencer, pelos sonhos. Ali, sentado ao meu lado, aquele homem bonito, vestindo roupas caras e de pele bem cuidada, não tinha mais aquele viço, aquela energia que a esperança, os sonhos e a vontade de meter as caras nos dá.

E a sua reclamação era a respeito dos filhos. Como algumas pessoas de Monte Alto, meus primos ainda me chamam de Zildinha, e ele me disse: “Zildinha, eu não reconheço os meus filhos. Acho que criei dois inúteis”. E aí, desfiou todo o seu rosário de lamentações. Disse que os filhos, já com mais de 30 anos, não saem de sob a asa dele. Que até o ajudam no trabalho, e ele reconhece isso, mas que eles vivem num mundo irreal, que não sabem conseguir nada por si, que dependem dele para tudo e que cada conversa é para pedir uma coisa. E, claro, essas coisas envolvem altas cifras, carrões etc.

Ouvi atentamente, sem falar muito, porque o que ele estava precisando mesmo era ser ouvido, desabafar e, além do mais, já vivi o suficiente para saber que um pai tem o direito de reclamar e até criticar os seus filhos, as outras pessoas não. Então, fui ouvindo e percebi que a ficha dele caiu com uma conversa com o netinho.

As crianças possuem uma inocência e ingenuidade que chega a ser comovente. A criança, de seis anos, ouviu da mãe e da avó, de quem o meu primo se separou há muitos anos, mas que ainda vive uma vida de luxos bancada por ele, que tudo o que ele tem será deles. E a criança abordou o assunto com o avô mais ou menos nos seguintes termos:

– Vô, a minha avó falou que tudo o que você tem vai ser nosso, a casa, os carros e mais um monte de coisa, mas que só quando você morrer. Vô, por favor, eu não quero que você morre!

Com voz embargada meu primo admitiu: “Zildinha, acho que criei mal os meus filhos, eu os protegi tanto, sempre quis dar tudo para eles e agora, eles não sabem se virar e essa conversa com meu netinho me fez ver que eu tenho mais valor morto!”

Então me lembrei de nossa meninice. Ele e os irmãos viviam descalços e tinham as solas dos pés vermelhos. Viviam numa pobreza tão extrema que, muitas vezes, a minha mãe, que também era pobre, fazia um esforço e comprava mantimentos para levar para eles. Depois, a vida seguiu seu rumo, cada qual foi tomando o seu caminho e este primo virou uma espécie de ídolo para todos nós, porque, profissionalmente falando, ele foi mais longe que todos.

Me lembrei que, algumas vezes tive uma espécie de inveja da filha dele, uma inveja retroativa. Ela é uma moça lindíssima, que se veste muito bem, viaja muito, tem uma vida muito boa, proporcionada pelo pai. E a minha “inveja retroativa” vem de comparar a minha vida na idade dela: para comprar uma camiseta que fosse, eu tinha de ralar, fui empregada doméstica anos, nunca tive nada de mão beijada e, mesmo ralando muito, nunca nem consegui imaginar o tipo de vida que ela tem, as escolas onde estudou, os lugares que conheceu. E, quando me passou esse pensamento, não só com relação a ela, mas com muitas outras mocinhas que conheço, pensei na diferença entre uma mulher que precisa batalhar e uma a que os pais proporcionam tudo. E, na minha inexata opinião, esse tipo de jovem é muito mais feliz do que eu e as amigas e primas pobres fomos em nossa juventude.

Mas ontem, ali, ouvindo meu primo e vendo o sofrimento dele, me senti tão afortunada pela vida que tive e tenho e senti sincera compaixão do meu primo. Fiquei calada a maior parte do tempo e, quando falei, apenas disse: “Zé, eles são o que você os ensinou a ser. Será que, por ter passado tanto perrengue, você não tirou deles a oportunidade de ver a vida como ela é?”

Ele abaixou a cabeça e concordou comigo. A irmã dele, mais velha que nós e com a autoridade que a idade lhe confere disse: “Você estragou seus filhos, agora, não adianta pôr a culpa neles! E nem tem mais jeito de mudar”.

Nossa noite de reencontro e de alegria, foi de reflexão e de certo lamento e o que senti foi que o meu querido primo não tem certeza de ser amado pelas pessoas mais importantes de sua vida. Certamente é, mas os filhos talvez não saibam demonstrar e realmente tenham se acostumado a uma dependência material extrema. Fui dormir pensando em muitas coisas, sobretudo no mal que nossa geração, que teve de lutar, fez aos próprios filhos, querendo dar a eles o que não tiveram e tirando deles a oportunidade de procurar o próprio rumo na vida.

Então pensei nos meus pais, que morreram tão pobres quanto eram quando vim ao mundo, e agradeci a Deus pela riqueza que eles me deram: a boa educação, a garra para lutar e capacidade de enfrentar qualquer coisa. E lamentei muito a colheita do Zé, e de tantos outros pais e mães que se sentem tremendamente injustiçados pela ingratidão dos filhos. É triste, mas, a verdade precisa ser dita: o plantio é livre, mas a colheita é obrigatória. Planta-se, colhe-se, fazer o quê?

Talvez esse pequeno netinho, com essa extrema expressão de amor: “Vô eu não quero que você morre! seja a semente boa dos frutos de um plantio ruim.

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