PENSAMENTO MÁGICO

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Eu tinha 28 anos quando recebi um telefonema avisando que minha mãe estava com câncer. Já se passaram 27 anos, mas ainda lembro detalhes daquele dia.  Era mês de julho e estava frio, eu vestia calça azul e um agasalho vermelho.  Fecho os olhos e consigo me ver caminhando num calçadão perto da Praça da República, em São Paulo, e ouvir o meu pensamento dominante, talvez o único pensamento que ocupou minha mente durante algumas horas: “Que bom seria se isso não fosse verdade! Que bom seria se minha mãe não estivesse com câncer!”

Eu tinha a sensação de que chegaria em casa, deitaria, cobriria a cabeça, dormiria e, quando acordasse, a realidade seria outra, o telefonema não teria acontecido, minha mãe não estaria com câncer, aliás, nem existiria câncer. Mas, meu pensamento mágico não teve o poder de mudar os fatos. Minha mãe morreu no dia 31 de agosto, um mês depois do diagnóstico. Ela tinha apenas 61 anos, mal começara a envelhecer.

É muito difícil lidar com o desconhecido e uma das reações que temos diante do que nos amedronta é a negação. É mais fácil negar o que está acontecendo do que enfrentar a realidade sobre a qual não temos qualquer domínio e que, muitas vezes, se mostra assustadora. Estamos atravessando um momento terrível, o mundo todo atingido por um vírus sobre o qual muito pouco se sabe, que se alastra poderosamente, cobrindo o planeta com a sua sombra e deixando um saldo de mortes e de caos por onde chega. E, diante dele, apavorados, muitos ainda têm a reação de negá-lo. Para isso, inventam mirabolantes histórias sobre conspiração, procuram criar culpados ou, mais ingenuamente, afirmam que se trata apenas de uma “gripezinha” sem maiores consequências. Uma “gripezinha” que mal chegou, mas, é mais fácil acreditar que ela já está indo embora – pelo menos parece ser essa a esperança negacionista do presidente. E, “como as pilhas de mortos ainda não apareceram”, como dizem muitos por aí, melhor sair de casa e esquecer essa história de quarentena, vai que é uma gripezinha mesmo?

Todos estamos assustados, todos estamos diante do desconhecido, um desconhecido invisível, com o poder bélico de uma bomba atômica. Um vírus que ataca não apenas o organismo das pessoas, matando muitas delas (embora seja quase inofensivo para uma grande massa de infectados), mas ataca também a economia, a religião, os valores morais, a necessidade de convívio, os empregos, os ânimos, os relacionamentos e até mesmo a sanidade das pessoas. Pessoas que acham que podem sair de peito aberto e teimosia em punho e impor a sua vontade para tentar vencer o invencível. Pessoas que se acham iluminadas, que acreditam que nosso país é especial, que somos seres privilegiados porque Deus é brasileiro e que, por isso, até mesmo a lógica e a ciência devem se dobrar a nós. Isso não é diferente do meu desejo de cobrir a cabeça e acordar numa circunstância nova e diferente, onde a vida da minha mãe não corresse perigo.

Ah, que bom seria se Bolsonaro estivesse certo! Que bom seria se ele fosse mesmo um messias predestinado a elevar o Brasil a centro do mundo e Deus fosse mesmo brasileiro, mas, infelizmente, não é assim. O pensamento mágico não funciona.

Que bom seria se a ciência fosse a grande inimiga e que o poder alquímico dos nossos chás de ervas, nossa cloroquina ou nossos remédios para vermes fossem mesmo capazes de matar o vírus e nos imunizar. Mas, não é assim. Aliás, ainda somos um país que sofre com vermes, com malária, com sarampo, com dengue, com chikungunya, com piolhos, com esgoto a céu aberto, com enchentes e deslizamentos que ceifam centenas de vidas, ano após ano, porque temos um problema crucial de moradia e uma discrepância social gritante. Temos miséria, temos fome e, por mais que isso desagrade e contrarie o presidente da República e seus apoiadores, temos Covid-19 e não falta muito para termos a falência do SUS. O que virá depois, só Deus sabe a dimensão.

Ah, que bom seria se aquele 7 x 1 nunca tivesse existido, que milhares de famílias não dependessem de R$ 191,00 mensais do Bolsa Família para não morrer de fome, que a ignorância não tivesse vencido o saber, que o desespero não tivesse vencido a resiliência, que a inveja e o medo de perder prestígio não tivessem vencido a dedicação e o trabalho, que ainda tivéssemos Mandetta no comando e uma mínima segurança de ter mãos firmes sobre o timão desse barco mal entrado nas brumas da tormenta e do mar bravio. Mas, venceu a boçalidade e isso já não é assim e agora temos um ministro da Saúde que é uma incógnita e parece ainda não saber o que está fazendo em Brasília e como deve agir.

O presidente usa o poder de seu pensamento mágico para acreditar – e tentar convencer a nação –  que todo trabalhador informal já fez seu batismo na água do esgoto e, portanto, está imune ao Coronavírus, por isso pode sair e trabalhar livremente, quebrando a quarentena imposta pelos demoníacos governadores e prefeitos mancomunados para provocar a sua queda, insistindo nessa bobagem de isolamento social. Mas, bom seria mesmo, Bolsonaro, Lula, Dilma, FHC, Color, Sarney, Doria, Caiado, Witzel, Ibaneis, Dino e todos os que já ocuparam o trono-mor do planalto e os troninhos dos governos estaduais, bom seria mesmo que não houvesse tanta gente dependendo do trabalho informal para conseguir levar comida para seus filhos, nas favelas, na miséria, na mais abjeta degradação. Gente cujos votos vocês disputam.

Que bom seria se o interesse eleitoreiro não se sobrepusesse a todos os outros interesses, se o poder não cegasse tanto, se as falcatruas e conchavos não estivessem na ordem do dia, se os poderosos não fossem blindados pelo sistema policial e judiciário, criados para defender os interesses e dar segurança a todos os cidadãos. Ah, que bom seria podermos nos deitar hoje, cobrir bem a cabeça, levantar amanhã e sair às ruas, cumprimentar as pessoas, abraçar os amigos, “beijar o português da padaria”, enfrentar mais um dia de trabalho e descansar no fim da tarde. Que bom seria se tantos de nós não estivessem adoecendo, que tanta gente no mundo não estivesse morrendo, que esse Coronavírus e essa Covid-19 apenas fizessem parte de uma obra de ficção.

Olhando para o caos do mundo, do qual temos tão farto exemplo por aqui, só me resta dizer: que bom seria se Jesus retornasse e entregasse os governos de todos os países aos seus arcanjos e serafins, porque enquanto existir política e políticos, nenhum vírus será páreo para tamanho poder de fogo e destruição.

 

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