Amor sem violência: saiba identificar quando você é vítima

A violência contra a mulher durante a pandemia causada pela COVID-19 aumentou; número de denúncias caiu; entenda o porquê

Antes de entrar no contexto da pandemia, é importante enfatizar que a violência contra a mulher sempre existiu. Em uma sociedade patriarcal, em que a mulher ainda é vista como ‘sexo frágil’ e ‘deve submissão’ ao seu parceiro, mesmo com a decisão de busca por independência e mudanças no cenário de gênero, os estereótipos ainda existem na luta das mulheres, como a luta por um salário igualitário, uma carreira de sucesso, o exercício de direitos e, o pior, a luta pela sobrevivência.

O contexto machista que impede que as mulheres consigam avançar diante desses estereótipos e dos retrocessos afeta diversos setores da sociedade e temáticas amplamente discutíveis, como a educação, política, saúde, economia, e questões sociais. Porém, dessa vez, discutiremos o tema do amor, um dos que mais possui concentração de vítimas e índices de crimes, como o feminicídio, ameaças e injúrias e outros tipos de violência, como a moral, psicológica, emocional, patrimonial, física e a existência do relacionamento abusivo.

Segundo dados da Delegacia da Mulher de Monte Alto, no ano de 2019, foram registradas 290 ocorrências de violência doméstica e em 2020, 170. O número de denúncias caiu, porém os casos continuam em alta.

Durante a pandemia causada pela COVID-19, em escala mundial, muitas mulheres, por conta do isolamento social, ficaram à mercê da presença de companheiros e ex-companheiros violentos, além de não terem uma espécie de refúgio, como o trabalho, espaços culturais para socialização ou outros em que poderiam buscar apoio ou debaterem acerca da temática.

Durante o primeiro semestre de 2020, o Brasil registrou 648 feminicídios; um aumento de 1,9% comparado ao ano de 2019, no mesmo período. Através de ferramentas que preservam a identidade de mulheres vítimas, O Imparcial recolheu alguns depoimentos em que outras muitas mulheres podem se sentir identificadas, estejam elas no contexto de violência ou relacionamento abusivo, já que mesmo não denunciando, infelizmente, passam pela mesma situação. Confira alguns deles. (*os nomes serão trocados para preservação da identidade das vítimas*).


Ana*: “Eu tenho 23 anos. Vivi um relacionamento abusivo durante um ano, aos meus 19-20 anos de idade. […] Desde o começo ele dava sinais de ser uma pessoa machista, autoritária, mas eu não dava muita importância… Com o tempo, eu tinha que passar todos os finais de semana com ele, nunca podia ficar na minha cidade ou na casa dos meus pais […]. Ele dava gritos, berros comigo… quando discutíamos, ele sempre entrava no carro furioso, dirigindo igual a um louco e eu tinha que ‘ceder’ para que ele parasse de dirigir assim, já que eu estava com medo. Outra vez, em uma festa, eu cumprimentei um ‘conhecido’ do qual ele não gostava. Ele surtou novamente, batia no chão da grama da chácara, desmaiou e foi parar no hospital por causa desse ataque de raiva. Lógico que eu me senti culpada logo em seguida do ocorrido. Como eu morava em outra cidade, eu era abusada psicologicamente apenas aos finais de semana. Porém, no período de férias, esses episódios se intensificavam mais. Com certeza foi um relacionamento péssimo e não desejo isso para ninguém […] aprendi muito, mas gostaria de não ter passado por isso porque levo traumas desse namoro até hoje. Levou um bom tempo para que eu pudesse me recuperar do abuso emocional que ele fazia comigo, mas estou feliz por ter saído dessa”.


Luísa*: “Eu o conheci no primeiro ano de faculdade […] Aos seis meses de relacionamento, ele me manipulou para que eu parasse de morar com minhas amigas. Ele me tratava mal, me xingava… eu tinha o meu dinheiro, e mesmo o dinheiro sendo meu, eu tinha que pedir permissão para fazer o uso do dele. Nas festas do final de ano, ele não me deixava ver minha família. Após cinco anos de relacionamento, eu me afastei de todo mundo, das minhas amigas, minha família. Eu sempre achava que ele estava nervoso por conta do trabalho… ele quem controlava tudo o que iríamos fazer. Nas festas da minha família, ele sempre inventava uma desculpa para não irmos. Até o baile da minha formatura ele não me deixou fazer, e isso era um sonho que eu tinha. Após um tempo, fomos morar fora do País e nos casamos no cartório. Eu não conhecia ninguém, não conhecia o idioma. Eu fiquei doente na primeira semana e ele disse que era frescura minha. Após isso, foi tudo piorando. Ele me xingava de nomes extremamente chulos. Um dia ele me empurrou da cozinha até o guarda-roupa e nesse dia, meu problema na coluna desencadeou outros problemas. Após essa agressão, eu liguei para a minha família e eu não contei sobre o que tinha acontecido. Eu disse para a minha avó que ia me separar, porém eu entrei em depressão e vi que eu precisava de ajuda. Me indicaram uma terapeuta e eu comecei o tratamento. Após alguns dias, eu sofri um acidente muito feio de carro. Durante a recuperação, eu percebi que mesmo com a dor dos machucados do acidente, a dor emocional de ser xingada, desrespeitada, explorada e humilhada por alguém era maior do que a do acidente. A terapia me abriu os olhos para entender o que eu estava vivendo. Um dia eu acordei e disse que eu iria voltar para casa. Ele me deixou sem dinheiro, cortou meus cartões. Eu voltei para o Brasil com pouco dinheiro e hoje nosso contato é só o que está com as leis, por conta das coisas materiais que construímos juntos. Hoje eu não consigo me relacionar direito com ninguém por conta dos traumas”.


A terapeuta Luciene Rebonato relata que muitas mulheres que estão em relacionamentos abusivos não expõem seus casos por vergonha ou medo e que a realidade da dependência financeira é um dos fatores decisivos para que muitas desistam da denúncia ou da renúncia a um relacionamento assim. Porém a realidade tem tido algumas mudanças: mulheres instruídas e com estabilidade financeira hoje também estão sendo vítimas desses abusos e não conseguem sair de relacionamentos dessa vertente abusiva. “Eu percebo que as mulheres vão tentando relevar e contornar para não terem que se expor, seja na violência sexual ou doméstica”, ressalta a terapeuta, que atende pacientes com históricos dessa temática.

Em relação aos primeiros sinais de alerta, a intuição é um fator muito importante. “Quando a mulher percebe que aquela forma de ser tratada não é uma forma legal… um cara que está sempre com a razão, que sempre responsabiliza a mulher por tudo que dá errado no relacionamento, que vive fazendo promessas de melhora e principalmente começa a afastar a mulher das pessoas que tentam ajuda-la, sejam familiares e amigos. O abusador tenta diminuir o círculo de convívio da parceria de forma que ele consiga uma certa exclusividade. Assim, a mulher começa a sentir coibida a estar em certos lugares, a encontrar as pessoas que ela gosta. O abusador tira a vítima do convívio e consequentemente, ela se acostuma a ser maltratada e passa a se convencer de que aquela situação é normal”, conta a terapeuta.

“Começou a se sentir ofendida, diminuída, culpada porque todos os problemas da relação são culpa da mulher, por exemplo, que não há mais liberdade de ir e vir são sinais clássicos do relacionamento abusivo. É importante instruir as crianças e adolescentes desde o princípio para que elas tenham consciência a respeito do tema para que no futuro, não sejam vítimas e nem abusadores em seus relacionamentos”, finaliza a terapeuta.

No Brasil, o aplicativo “Direitos Humanos Brasil” foi lançado para que as denúncias de violência de qualquer natureza sejam realizadas de forma online, além do Disque 100 e Disque 180, que continuam a funcionar normalmente no período de pandemia. As vítimas devem ser encorajadas a denunciar, a fim de que zelem pela sua integridade e vida. O Imparcial agradece às vítimas que relataram suas experiências para que outras possam ser encorajadas a tomarem atitudes, sobretudo, por elas mesmas.

 

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